terça-feira, 31 de agosto de 2010

Lavagem de fios de contas


O assunto que eu resolvi postar hoje é extremamente delicado, do mesmo modo que é importante. A lavagem dos fios de conta.
Este ritual, que vem a cada ano mais e mais sendo deixado de lado nas casas de Candomblé, marca a entrada do neófito, ou candidato à iniciação, no ritmo da casa e no processo de adequação entre os iniciados e o Abiã.

Segundo Guilherme Lemos, “mais que um adorno, é uma marca e uma fonte de axé. O simples colar ao ser imerso na devida mistura de folhas quinadas, associada a alguns outros materiais, transforma-se numa identificação que remete o indivíduo ao seu lugar na comunidade. A cerimônia da lavagem das contas é, por assim dizer, a inserção do neófito no universo mítico e místico do candomblé. Ao receber seus primeiros fios-de-contas, geralmente um fio de Oxalá e outro de seu orixá pessoal, o então abiã se apercebe da importância de Oxalá no conjunto dos orixás. Oxalá é o deus do branco, o pai dos orixás, ou seja, uma energia geradora que antecede, no tempo, os demais orixás. Oxalá pró-cria, abranda, esfria e descansa. Os primeiros conhecimentos acerca deste orixá circunscrevem-se na própria simbologia do branco que, sendo o somatório de todas as cores, traz em si todas as possibilidades de cor. É a energia de onde tudo sai e para onde tudo retorna, por isso o branco é tanto a cor que festeja o nascimento como a que marca o momento da morte. O luto no candomblé é branco pois representa o retorno do indivíduo à massa informe da ancestralidade. Por isso, necessariamente, o primeiro fio que se recebe é o branco de Oxalá, simbolizando o estado de latência que caracteriza o abiã com um candidato à iniciação”[i]

Neste sentido mais geral e abrangente, os fios devem ser a marca inicial de um compromisso do abiã com a casa e seus integrantes. O ritual de lavagem é administrado pela mãe-de-santo ou pai-de-santo, demonstrando a importância desse primeiro vinculo com a religião. A partir deste momento este indivíduo faz parte do axé e vai ficar assim até que haja a determinação de se proceder a iniciação propriamente dita. Esta determinação pode vir tanto do Orixá dono da casa, quanto do próprio Orixá do abiã. Este ritual é tão forte e poderoso que existem casos em que o Orixá da pessoa se contenta com este e não há cobranças em relação a uma iniciação de feitura.
Os compromissos com a casa que o abiã tem são os mesmo que as demais pessoas iniciadas, havendo aqui um enorme diferença em relação aos compromissos rituais e de participação nos mesmos, ficando o abiã provado de maiores participações e de aprendizado. Seus deveres contudo são muito grandes e vão desde a limpeza da casa até a preparação dos espaços onde ocorrerão os rituais fechados. Lavar roupas, cuidar de criações e do quintal do barracão são coisas que os abiãs devem se revezar, estando sempre presentes no Axé, trabalhando e ensaiando danças.
Dentro dos textos aos quais tive oportunidade de ler, sempre percebi de forma subliminar que é neste período que se mostra a característica de participação e os aprendizados em relação às cantigas e danças dos Orixás. Onde há oportunidade de se fazer laços que podem se estreitar numa iniciação, formando o barco de feitura, que irá determinar uma enorme ligação entre seus participantes. Mas este é um assunto muito extenso que deve ser tratado em outros momentos.
Finalizando, percebo que há hoje em dia muita troca de casa por parte das pessoas que não se importam com essas ligações. Ora, se estamos em uma religião que trata de seres míticos e que lida com energias, por que as energias destes rituais estão cada vez mais sendo deixada de lado e perdendo importância? Por que há cada vez mais relatos nas casa de indivíduos que mal se colocam na condição de abiã, se iniciam e logo em seguida não suportam as condições da vida do terreiro, abandonando a casa e até a religião?
Estes fatores associados podem de algum modo explicar estes eventos, infelizmente cada vez mais frequentes, de abandono e descaso com a religião.
Gostaria de receber comentários a respeito deste assunto que tanto nos aflige.


A benção!

domingo, 29 de agosto de 2010

Ìrókò


ÌRÓKÒ

Nome  científico: Ficus doliaria M. art., Moraceae


Elemento que rege: fogo/masculino

É considerada uma árvore sagrada dentro dos cultos Nagô e é cultuada também por ser moradia d o Orixá de mesmo nome. Tem características muito próximas de Xangô e suas folhas são usadas em banhos e obrigações para este Orixá. É atribuída também a Oxalá, pois no oriki onde aparece relacionada aos orixás da criação ela é reverenciada como "Ìrókò! Oluwéré, Ògìyán Èlèijù", que pode ser livremente traduzido como: Ìrókò, arvore proeminente entre todas as outras, o Òrìsà-funfun (Ògìyán) da âmago da floresta.
Suas folhas  são consideradas quentes por alguns e frias por outros, pois em certas cantigas e rezas de Sassanha a ela é atribuído poder calmante. Tem poderes de cura e deve ser colhida em certas horas do dia, pois senão sua energia poder fazer efeito contrário. Dizem que folhas de Ìrókò sob o travesseiro de um doente tem poderes de espantar a morte.
Neste primeiro post deste blog eu resolvi falar sobre uma árvore que tem grandes poderes, que pode atender a quase todos os pedidos e recebe quase todo o ebò que aos pés dela se deposita. Esta foto é de um pé de Ìrókò que temos na mata próximo ao barracão de meu Pai.

Em nossa casa não tínhamos uma gameleira perto e sempre fazíamos as oferendas em árvores frondosas. Logo em minhas primeiras atribuições como babalossaiyn eu tive grandes dificuldades em lidar com isso. Mas em uma obrigação de ano em minha casa, de uma filha de Xangô, ao conversar com meu Ossaiyn e fazer as devidas oferendas antes de me adentrar no mato para levar as comidas do Orixá para ser devidamente entregue, tive uma intuição de seguir por um caminho oposto ao comumente adotado. Não sou muito adepto dessa coisas, pois tenho muito receio de me encontrar com pessoas indesejadas no caminho. Mas neste dia algo me falava que eu devia me "aventurar" um pouco. Eis que em poucos metros de minha casa eu me deparo com uma enorme copa de árvore, vista de frente, mas que ao me aproximar, havia uma descida e que se tratava de uma árvore muito alta, pois do ponto de vista do barracão ela parecia uma árvore de porte médio. Assim que me aproximei do seu tronco tive arrepios e senti a presença de muitos de meus Orixás. ao abaixar para fazer as oferendas pude notar que as folhas caída no chão eram de um genuíno Ìrókò. Meu orixá quase virou ali mesmo!
Foi uma das melhores experiências de minha vida no Orixá.

Esta pequena história é mais um incentivo pra começar a relatar coisas, falar da vida dentro de uma casa de culto de Orixás, de trocar informações, promover encontros e discussões a respeito desta cultura e destra religião.
mande sua história e troque idéias aqui!

"KOSÍ EWÉ, KOSÍ ÒRÌSÁ!"


a benção a todos.